“Os interesses do mercado não podem ser a régua para a Educação Superior.”
O Ministério da Educação lançou oficialmente, nesta quarta-feira (17), um programa com a justificativa de reestruturar o financiamento do ensino superior público. A proposta, chamada “Future-se”, pretende estimular a participação do setor privado nos orçamentos das universidades e institutos federais através de PPP’s, concessão de prédios, fundos de pesquisas por meio de doações e, até mesmo, a venda de nomes de campi. Antes da adesão, haverá uma consulta pública que já se encontra disponível.
O lançamento ocorre em meio aos cortes orçamentários das Universidades anunciados em abril. Esta medida tem afetado, de forma intensa, o funcionamento das instituições, tendo, inclusive, várias delas informado que será necessário paralisar atividades e suspender pagamentos a terceiros, se os cortes não forem revistos.
Sabemos que o estrangulamento dos recursos orçamentários não é algo inédito para a educação pública. Durante o governo FHC, as verbas para educação caíram 19,57%. Foram gastos R$ 45 bilhões para pagamento da dívida externa, enquanto a educação recebeu apenas R$ 9 bilhões. Dentro do seu ”Pacote Fiscal”, de outubro de 1997, foram cortados do sistema federal de fomento à pesquisa o valor de R$ 450 milhões, enquanto para as universidades particulares foram propostos recursos da ordem de R$ 300 milhões.
A Emenda Constitucional 95, que criou um teto para os gastos públicos pelo período de 20 anos e reduziu, substancialmente, os recursos que garantem os direitos sociais, foi um dos mais duros golpes contra a nossa Constituição Cidadã. Como resultado, as universidades públicas tiveram uma drástica redução nas verbas de custeio e no orçamento de pesquisa. O objetivo de acabar com o ensino público superior é algo perdurável em nosso país.
Apesar do programa se apresentar como a possível solução dos problemas causados pela “falta de verba”, é importante pensarmos como o “Future-se” pode afetar, diretamente, a pluralidade e liberdade crítica que tanto prezamos em nossas instituições e aumentar mais profundamente a desigualdade no ensino superior.
Não se trata pura e simplesmente de juízo de valor diante da possibilidade de um diálogo entre o investimento privado e as universidades, mas de saber que o conhecimento científico e a autonomia das universidades não podem estar submetidos à lógica do mercado. Pergunte-se: onde as empresas terão preferência em realizar seus investimentos, em cursos e projetos já consolidados e que oferecem retornos financeiros no curto prazo ou em estudos e estruturas que visam diminuir a desigualdade e democratizar o acesso ao ensino superior?
Cursos e pesquisas que não despertam os interesses do mercado serão os mais prejudicados pela mudança. As parcerias são sim importantes, mas o “Future-se” não se trata apenas disso, trata-se de deixar as universidades à mercê dos interesses da iniciativa privada em financiá-las, onde captar recursos será a meta, isso é inconcebível! Universidade não é indústria e educação não é produto a ser comercializado!
As alternativas de financeirização do “Future-se”, de acordo com o sociólogo e cientista político Rudá Ricci, são baseadas no receituário da “Education Commission”, sugerido pelo Enviado Especial da ONU para Educação Global, Gordon Brown. De acordo com o sociólogo, “este receituário não conseguiu êxito em lugar algum do mundo. Contudo, sugere um caminho de captação de recursos privados (inclusive) para atingir os objetivos do Milênio na área educacional. Ora, captar recursos privados é, na verdade, negociar os conteúdos e foco da educação”.
Outra orientação do “Future-se” é a transferência da gestão das universidades públicas para a iniciativa privada, via Organizações Sociais (OS), o que não garante que os serviços serão melhores, mais transparentes e mais baratos. Esta orientação foi motivo de embate, durante a segunda gestão Lula, com o Conselho Nacional de Saúde, que a rejeitou. O governo Lula queria transferir toda gestão dos hospitais federais – e parte da estrutura gerencial do SUS – para OS. Contudo, em 2011, já no primeiro governo Dilma, foi criada a EBSERH, que passou a gerenciar toda a rede de hospitais universitários e que, quase dez anos depois, ainda não provou sua efetividade.
A nossa defesa segue os princípios de luta pela educação pública, gratuita e de excelência deliberados pelo II Congresso Nacional do ATENS Sindicato Nacional em 2018 e, por isso, não apoiaremos nenhuma intervenção da iniciativa privada e dos interesses do mercado nas universidades.
Por estes motivos, o ATENS Sindicato Nacional se posiciona contrário ao projeto “Future-se” e orienta toda a sua base a rechaçar a proposta do governo na consulta pública disponível no link https://isurvey.cgee.org.br/future-se/ até 15 de agosto.